05 julho, 2010

Kerouac

A experiência humana é sonho casual das almas que habitam o deserto, delírio coletivo da mente que ferve ao sol. O abrigo, efeito contra a insolação, é evitado ao máximo.

O traçado tão aleatório e visceral, desses todos que se perdem desesperadamente, ao mínimo esforço de se encontrar em meio ao deserto, é síntese máxima do delírio conjunto.

O acaso marca pegadas irregulares na areia que grita a morte da razão enquanto bebe o sangue dos desesperados.

Tempestades de areia afugentam a teimosia dos esperançosos que planejam a fuga a passos marcados.

Ainda, tão quente quanto fervem as rochas, a terra, a cabeça e a mente, ferve o asfalto, no distante horizonte. E como corre o vermelho do cadilac. Indistinguível e fugaz ponto de inspiração àqueles bilhões que assistem a esperança cruzar-lhes a vista no alto som de sua passagem.

Jack Kerouac acelera seu motor, e como voa a válvula de escape da humanidade – fuga do delírio coletivo –. A 120 por hora, sua passagem é anunciada pelo canto choroso do coiote que ruma ao abrigo.

Neal Cassidy, vulgo Moriarty, no banco de trás.

Indistinguível das tantas outras, a dama da vez lhe oferece os peitos. O cigarro voa janela a fora, oferecido a alguma raposa curiosa. Enfim, as mãos livres tocam a fonte da sede suja, enquanto a boca reclama o rápido gole do vistoso leite depravado.

Kerouac. Seu diário de bordo é o olhar rápido pelos transeuntes da noite, enquanto a escuridão encobre os últimos raios do sol, e a lua se impõe ao alto das distintas montanhas.

On the Road, diz seu titulo, é retrato do voyeur que experimenta, alucinado, o delírio sóbrio a que se submete o coletivo, no vazio de sua solidão.

Kerouac é a veloz mão do datilografo inspirado por Cassidy. Kerouac, inspirado pelo forte cheiro de cachaça que emana poro a poro do bêbado à sarjeta, delira imagens nostálgicas de dias vivazes sobre o limpo papel branco.

Impressão literária e eterna da fugaz experiência passada. Bruta na pele da gente ordinária, e suave na lembrança do romântico baderneiro.

E o viajante solitário segue em frente.

4 comentários:

Gigante Colorado disse...

Nossa! Eu adorei o seu blog! Muito legal mesmo! Meus parabéns!!!
Eu tentei seguir... Mas não abre aqui pra mim! Oo Que pena!!!
=///

Beijoooo (Gabriela)

Nanci S. Bizutti disse...

Jack Kerouac? li a biografia dele, escrita inovadora *--*

l. f. amancio disse...

Ler Kerouac é sempre inspirador. Aguça os sentidos, nos faz querer intensificar o modo como experimentamos o mundo. Em "On the Road" isso é feito literalmente, o indivíduo vivendo a existência e tudo que ela pode oferecer. Mas em outros livros, isso é mais sóbreo, com o zen, o universo intimista já se apresenta intimidador o suficiente.

Anônimo disse...

Chega me dr um gosto de poeira da estrada na garganta Matheus.Acho que para resolver isso só uma garrafa de gim hahahaha!Abrç

Fábio Zen
http://oficinamissoes.blogspot.com/2010/07/em-carne-viva-xiv.html