04 março, 2012

Drive



“Eu não tomo parte no esquema. Eu não carrego uma arma. Eu dirigo”. – Driver

Pelo decorrer das quase duas horas de filme, isso é tudo que o espectador de Drive saberá sobre seu protagonista.

O conhecemos como Driver e jamais o distinguiremos dos carros que dirige.

Eis que Ryan Gosling assume a objetividade sóbria e misteriosa de um sujeito sobre quem nada é revelado. Nosso protagonista é um homem determinado pelo que faz, e se seu trabalho exige que ele vá ao extremo das situações com as quais se depara, bem... ele vai.

Ele é um fenômeno, daqueles que aparecem de tempos em tempos nas telas de cinema e, dali, se projetam para a história. Sua força e dimensão vão além das palavras e não podem ser expressos de outra forma senão pelo olhar determinado de Gosling.

Drive parte de uma premissa genérica, capaz de servir a qualquer filme de ação barato com o Denzel Washington no elenco. A grande sacada, no entanto, é focar-se no personagem, invés da situação. Pouco interessa quais são as pressões externas exercidas sobre nosso herói. O que importa é a posição deste herói frente o universo que o cerca.

Aqui, é imprescindível o trabalho da fotografia do veterano Newton Sigel, que usa Gosling como seu objeto de maior interesse. Sigel se vale das ruas de Los Angeles, com seus iluminados letreiros de neon, para projetar sobre os traços de nosso protagonista um ar de mistério.

O que é preciso deixar claro, justamente por ser o grande diferencial do filme, é que todo o esforço dedicado na realização de Drive parece estar intencionado em valorizar a trajetória do herói, cujas mudanças ao longo do filme são percebidas por pequenas nuances, como um sorriso de canto de boca ao encontrar com a vizinha por quem ele acaba se apaixonando.

E aí, o mérito do diretor Nicolas Refn é dividido com toda sua equipe e elenco.

Em princípio, Refn já faz um grande trabalho ao trazer uma alma realmente autoral para o projeto, estilizando a violência de uma maneira vista somente em filmes como Laranja Mecânica, Oldboy e poucos outros.

Posto isso, o contraste criado na montagem do filme, pelo editor Mat Newman, entre uma fotografia crua e impactante, por ocasião de sua violência, e uma suave trilha composta por Cliff Martinez, parece propor a visão subjetiva do próprio protagonista do filme sem que seja necessário o uso de uma câmera subjetiva. Isso porque o clima criado a partir do contraste entre a violência visual e a beleza musical parece expressar o mesmo sentimento que vemos expresso nos olhos de Gosling durante o filme todo.

Com esse contraste, o espectador se torna cumplice de Driver e passa a enxergar o mundo da mesma forma que seu protagonista, oferecendo um triste olhar para um mundo belo, ou talvez seja o contrário.

Comento pouco a respeito da trama do filme, porque, novamente, não é isso que está em jogo, aqui. É importante saber, somente, que toda a trajetória do protagonista, será dada em função de uma nova forma de encarar o mundo, como se, de repente, um universo que fosse feio e cruel, em função de sua violência, pudesse se tornar belo em função de um novo amor.

Há muito tempo, Hollywood não oferecia um filme com a força de Drive e, ainda que não se reconheça, este foi um dos grandes de 2011.

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