02 novembro, 2011

Caminhos da Mostra (I) - JESS+MOSS



O que a Mostra tem de melhor é sua capacidade de surpreender.

É nessa época do ano que entro em diversas salas de cinema, cidade afora, sem ter a menor idéia sobre o filme que estou prestes a assistir. Foi assim com JESS+MOSS.

Na realidade, minto quando digo que nada sabia sobre JESS+MOSS. Alguns dias antes havia lido uma pequena sinopse do filme. Sabia se tratar da relação entre uma menina e um menino em uma pequena cidade ao sul dos Estados Unidos.

Era o suficiente pra mim.

Pequenos fins de mundo ao sul dos Estados Unidos tem servido como cenário para filmes desde o cinema de Kazan (que, por acaso, tem uma ótima retrospectiva nessa Mostra).

Com Kazan, propriamente, nasceu a tradição de retratar os pequenos dramas de uma gente miserável em uma terra hostil.

E esse tipo de história carrega sempre uma melancolia irresistível, tendo atraído gente como Scorsese em seu “Alice Não Mora Mais Aqui”, Wim Wenders com “Paris, Texas”, Ridley Scott com “Thelma e Louise” e, obviamente, Bogdanovich com “A Ultima Sessão de Cinema”.

Bem, voltemos a JESS+MOSS. O diretor estreante, Clay Jeter, toma esse mesmo bastão em mãos e não desaponta, muito pelo contrário, encanta.

Eis um filme sobre um país (e, aqui, tomemos o sul dos EUA como um país a parte), abandonado e esquecido. Eis o retrato de uma terra sem memória ou referências, levada às tralhas pela modernidade. Eis um conto idílico sobre dois jovens retirados numa ilha imaginaria em meio à uma vasta terra.

Em meio a fragmentos de um passado onde a inocência era lei, JESS, a menina mais velha, tenta se agarrar a qualquer coisa que lhe dê a mesma segurança dos dias passados, onde tardes de verão em meio às plantações de milho eram regadas a limonada caseira. E MOSS, o menino mais novo, quer saber tudo sobre esses verões passados, sobre uma época em que as pessoas estavam amparadas numa tradição irretocável.

O grande problema para ambos é como evitar o choque de realidade causado pelo desamparo. Eles estão abandonados nessa terra. São os últimos espécimes de uma coleção já extinta. Não há mais vida nessa terra; não há mais tradição.

Os caminhos para entender JESS+MOSS, o filme, e Jess e Moss, os personagens, são vastos.

Esse é o tipo de cinema que te deixa imóvel alguns bons minutos após o término da sessão. Por isso, enquanto eu assistia ao passar dos créditos, tentava entender o que no filme havia mexido tanto comigo. E, bem, essa é a beleza da coisa, porque ele é de certa forma indecifrável.

JESS+MOSS é um filme sobre o confronto com o amadurecimento, mas é também um belo conto sobre um país sem memórias e, portanto, sem afeto. JESS+MOSS é um filme sobre tantas coisas ao mesmo tempo que talvez, no fim das contas, possa ser apenas um filme sobre dois jovens e nada mais.

Ainda que num primeiro momento não se tornem claras todas as intenções do filme é fácil entender o que nele me agrada tanto. Enquanto seres humanos, somos todos sensíveis ao mundo e é, portanto, essa sensibilidade que nos torna capaz de apreciar uma beleza legítima, tal como a que nasce dessa primeira obra-prima do diretor Clay Jeter.

E a Mostra continua...

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