Mon Oncle, o livro, acaba de ser lançado pela editora Cosac Naify.
Tomando por base a obra cinematográfica de Jacques Tati, o escritor Jean-Claude Carrière escreveu em 1957 um pequeno romance.
A obra literária narra exatamente a mesma história do filme, dessa vez, pela perspectiva do garoto Gerard, sobrinho de Hulot, o que torna o texto muito mais pessoal.
Crescido, Gerard narra as desventuras de sua infância ao lado de seu tio.
Como se fosse um diário, Carrière elabora um discurso singular e muito particular. As palavras que descrevem a nostálgica época da infância do garoto são tão pessoais que tornam a coisa toda nostálgica para nós.
Um texto tão descritivo que alem de imagético, chega a ser virtual. Somos colocados, tão tranqüila e gradualmente, dentro daquela cidade na França que só percebermos nosso grau de interação com o livro quando já estamos sentido os aromas e nos sujando com a lama da pequena e popular pracinha onde morava o personagem Hulot.
O filme de Tati, hoje em dia, pode não ser tão apreciado como com certeza fora na época, isso se deve a seu timing, seu ritmo. As gags da obra de Tati são, em grande parte, o fio condutor do filme. Os tempos de silencio, que na época surtiam um efeito cômico, bem como apaziguador, hoje em dia podem parecer um pouco despropositados e inquietantes. Eles serviam de suporte a figura ingênua e calma de seu protagonista, mas sob a pressa de nossa atual sociedade, ter um timing como esse, pode parecer uma ingenuidade da obra em si.
Sob essas considerações, a leitura do livro seja, talvez, mais agradável.
O ritmo calmo do filme é transposto num equivalente tempo verbal, mas preenchido com as considerações do garoto, o que torna o texto, alem de mais afetuoso, mais “concreto”, por assim dizer.
Apesar disso, o filme também caracteriza uma qualidade prazerosa e afetiva com aquele retrato.
Na obra de Tati, no entanto, somos, de certa forma, apresentados àquele ambiente, espiamos aquele mundo, e nos divertimos com ele. Mas para por ai.
Já no livro, devido à pessoalidade da descrição dos eventos, nos identificamos tanto com aquele lugar e aquele tempo retratados que é como se fosse próprio a nós. O afeto pelo tio, que permeia o texto de Gerard, se torna nosso. A descrição do Mr. Hulot é de tal modo, bem feita, que compreendemos aquele senhor com os mesmos olhos que Gerard em sua infância.
Como o personagem mesmo descreve no começo do livro – “Eu tinha um tio. É difícil enxergá-lo com olhos de adulto. Ele ficou como a única alegria da minha infância, e tenho medo de desfigurar a imagem que guardei dele. (...) Meu tio Hulot me parecia, quando eu era criança, um personagem ao mesmo tempo próximo e distante, indiferente e caloroso. É difícil explicar, eu sei. (...) Talvez eu tenha guardado uma imagem inexata do meu tio; (...) Mas quero falar dele como se ainda tivesse oito anos.”
Como prometido nas primeiras paginas do livro, o personagem Gerard delineia uma imagem de seu tio que transpassa esses tão mesmos sentimentos em relação a seu tio.
Vemos o personagem Hulot pelos olhos daquela criança que passou parte de sua infância com ele, e que, de certa maneira, não compreendia aquele sujeito, ambíguo aos seus olhos. Hulot, portanto, nos é deliciosamente ambíguo, de um jeito muito divertido.
A dar suporte ao texto, ainda, o livro conta com ilustrações feitas por Pierre Étaix, valorizando a descrição e tornando a experiência toda ainda mais agradável.
O livro, por fim, é um agradável saborear de uma época que desconhecemos.
4 comentários:
Não parece ser nada inovador, mas aparenta ser uma leitura leve e agradável. De sentar e ler numa tacada só... Aliás, estou mesmo colhendo indicações de leitura. Procurarei na livraria e na folheada, verei se esse se adequa ao tipo de literatura que eu curto.
Aparece ser bom ^^
Adoraria ler ;D
Bjo
Eu ainda quero ler esse livro, mas infelizmente não o encontro para adquirir. Em nenhum site, até. :/
Verball
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Você fez uma leitura bem trabalhada do livro e sua resenha demonstrou que conhecia e reconhecia detalhadamente os principais grifos teóricos da obra em questão, isto demonstra ser um literato intelectual, parabéns!
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